segunda-feira, 8 de agosto de 2011

Teoria da Imprevisão pela Onerosidade Excessiva


                 
                Instituto que tem origem no art. 6º, V, do CDC - Art. 6º. São direitos básicos do consumidor: V - a modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas; - nas relações de consumo, a conseqüência que o regramento dá quando verificada a onerosidade excessiva não é o da resolução do contrato de consumo, mas o da revisão e modificação da cláusula ensejadora da referida onerosidade, mantendo-se o contrato no demais, no fito de que se restaure o equilíbrio contratual.
Já no ordenamento civilista, a onerosidade excessiva dá razão tanto à revisão do contrato quanto à sua resolução, pois não se exige da parte sacrifícios manifestamente desproporcionais ao valor da prestação que lhe cabia.
Duas são as hipóteses de quebra deste equilíbrio econômico no contrato: (a) na primeira, a prestação devida se avoluma, crescendo demasiadamente em completa desproporção, o que é a onerosidade excessiva; (b) a prestação é reduzida também de forma a quebrar a equivalência com o valor da contraprestação, dando ensejo à correção monetária.
Em ambos os casos, a revisão do contrato justifica-se pela teoria da imprevisão – cláusula rebus sic standibus – cuja aplicação requer o implemento das seguintes condições: (a) contrato de execução futura (diferida ou sucessiva); (b) deve ocorrer uma imprevista alteração das condições econômicas do momento da pactuação; (c) esta alteração deve acarretar uma onerosidade excessiva para uma das partes; (d) o contrato deve ser pré-estimado, ou seja, as suas prestações devem ser previamente conhecidas.
Tal teoria da imprevisão, porém, tem inconveniente. A sua base subjetiva – insistindo nas expectativas alimentadas pelas partes sobre a permanência ou sobre certa evolução futura das circunstâncias que elas tinham como essenciais e que seria afetada pela superveniência de acontecimentos imprevistos e imprevisíveis.
Faz-se, sim, necessária uma reformulação em termos objetivos da teoria da imprevisão, tomando-se por base os fundamentos da teoria da base negocial, que consiste no conjunto de circunstâncias cuja existência e ou persistência considera-se imprescindível para que o contrato seja cumprido.
Pelo princípio fundamental da obrigatoriedade das convenções, não é dado a uma das partes alterar a avenca unilateralmente, ou pedir ao juiz que o faça. Somente em situações excepcionais é que a doutrina e a jurisprudência das últimas décadas tem admitido uma revisão das condições dos contratos por força de uma intervenção estatal – judicial.
A possibilidade de tal intervenção judicial no contrato ocorrerá quando um elemento surpresa, uma circunstância nova, suja no curso do contrato, colocando em situação de extrema dificuldade um dos contratantes, ocasionando uma onerosidade excessiva de sua prestação.
Porém, tal imprevisão é somente a que refoge por inteiro a qualquer possibilidade de previsão e, ademais, deve ser global, ou seja, que atinja a sociedade em geral, ou um segmento significativo da sociedade.
Se um fator externo rompe o equilíbrio contratual, estará ai autorizada a intervenção e, ademais, tendo em vista que o contrato desempenha um papel social, no momento em que rompido este equilíbrio social e econômico representado pelo contrato, atingida está a sociedade e a economia e, a partir de então, possível mostra-se à revisão.
Há uma consciência media da sociedade que deve ser preservada e, desequilibrado este estágio, estarão abertas as portas da revisão.
Não pode a teoria da imprevisão ou da excessiva onerosidade servir para a panacéia de proteger o mau pagador, devendo imperar o bom senso no caso concreto à solução da lide. Aplicação do sentido geral de justiça.
Contrato é “o acordo de duas ou mais vontades, na conformidade da ordem jurídica, destinado a estabelecer uma regulamentação de interesses entre as partes, com o escopo de adquirir, modificar ou extinguir relações jurídicas de natureza patrimonial.”
Segundo Washington de Barros Monteiro contrato "é o acordo de vontades que tem por fim criar, modificar ou extinguir um direito".
Assim como todos os institutos do direito, os contratos também se fundam em princípios. Um dos princípios primários é o da força vinculante das convenções. “O princípio da força vinculante das convenções consagra a idéia de que o contrato, uma vez obedecidos os requisitos legais, torna-se obrigatório entre as partes, que dele não se podem desligar senão por outra avença, em tal sentido. Isto é, o contrato vai constituir uma espécie de lei privada entre as partes, adquirindo força vinculante igual à do preceito legislativo, pois vem munido de uma sanção que decorre da norma legal, representada pela possibilidade de execução patrimonial do devedor. Pacta sunt servanda.”
Mas esse princípio, com o tempo, perdeu parte de sua eficácia.
A principal nótula dessa sensível mudança é a cláusula rebus sic stantibus que modernamente vem sendo chamada de Teoria da Imprevisão. “A imprevisão consiste assim no desequilíbrio das prestações recíprocas, nos contratos de prestações sucessivas ou deferidas, em conseqüência de acontecimentos ulteriores à formação do contrato, independentemente da vontade das partes, de tal forma extraordinários e anormais que impossível se torna prevê-los razoável e antecedentemente. São acontecimentos supervenientes que alteram profundamente a economia do contrato, por tal forma perturbando o seu equilíbrio, como inicialmente estava fixado que se torna certo que as partes jamais contratariam se pudessem ter podido antever esses fatos. Se, em tais circunstâncias, o contrato fosse mantido, redundaria num enriquecimento anormal, em benefício do credor, determinando um empobrecimento da mesma natureza, em relação ao devedor. Consequentemente, a imprevisão tende a alterar ou a excluir a força obrigatória do contrato.”
Com efeito, “a teoria da imprevisão encontra-se submetida à existência de três requisitos, quais sejam: a) que o prejuízo resulte de evento alheio ao comportamento das partes; b) que o evento determinante do prejuízo não seja apenas imprevisto, mas também imprevisível; c) que o prejuízo resultante para o onerado seja significativo, gravemente convulsionador da economia do contrato.”
“No Brasil não se encontra texto expresso abraçando genericamente a teoria da imprevisão. Mas é inegável que ela inspirou o legislador na elaboração de alguns preceitos esparsos(...) Mas, a despeito da inexistência de regra geral sobre a matéria, a maioria dos escritores entende que a teoria da imprevisão se aplica entre nós(...) Na jurisprudência, por igual, tal tendência tem prevalecido. De fato, após algumas hesitações onde predominam arestos em sentido contrário, parece ter se firmado orientação no sentido de se permitir a rescisão dos contratos, em virtude da excessiva onerosidade das prestações, oriunda de acontecimentos extraordinários e supervenientes, imprevisíveis por ocasião do negócio.”
Essa falta de lei que expresse tacitamente a teoria da imprevisão foi suprida com o advento do Novo Código Civil.
O Código Civil de 2002 em seus artigos 478, 479 e 480 estipula a resolução do contrato por onerosidade excessiva e traz o seguinte texto:
“Art. 478. Nos contratos de execução continuada ou diferida, se a prestação de uma das partes se tornar excessivamente onerosa, com extrema vantagem para a outra, em virtude de acontecimentos extraordinários e imprevisíveis, poderá o devedor pedir a resolução do contrato. Os efeitos da sentença que a decretar retroagirão à data da citação.
Art. 479. A resolução poderá ser evitada, oferecendo-se o réu a modificar eqüitativamente as condições do contrato.
Art. 480. Se no contrato as obrigações couberem a apenas uma das partes, poderá ela pleitear que a sua prestação seja reduzida, ou alterado o modo de executá-la, a fim de evitar a onerosidade excessiva.”
Para que aconteça a resolução nos moldes do Código Civil, são necessários alguns requisitos elencados nestes artigos. Ela só ocorrerá nos contratos de execução continuada ou diferida onde será necessário que ocorra concomitantemente a excessiva onerosidade na prestação de uma das partes e extrema vantagem a outra, ocorrendo apenas quando há fatos extraordinários e imprevisíveis. “A onerosidade excessiva da prestação de uma das partes acha-se vinculada, ratio legis, ao resultado de extrema vantagem para a outra, para tipificar o desequilíbrio contratual.” O réu poderá evitar a resolução caso se manifeste a favor de modificar eqüitativamente as condições do contrato e necessariamente a onerosidade deverá ser reconhecida por sentença, ser argüida no Poder Judiciário, sendo que seus efeitos deverão retroagir à data da citação.
Tanto o credor como o devedor poderá pleitear na Justiça a resolução. “Ora, com os níveis atuais de evolução da doutrina, sabe-se que a imprevisão pode resultar em resolução ou revisão do contrato, consultando apenas ao interesse das partes postular por uma ou outra solução. Ademais, credor e devedor devem necessariamente figurar em posição de igualdade frente aos benefícios da teoria, desde que demonstrem o legítimo interesse (a comprovação de que a onerosidade excessiva está a lhes causar prejuízos ou a tornar insuportável a permanência da execução do contrato). Razão disto é a natureza do sinalagma e o princípio constitucional da isonomia.”
Os contratos podem ser extintos de duas formas: de forma normal e de forma anormal. Fala-se em extinção de forma normal quando o contrato é cumprido, ou seja, quando ambas as partes satisfazem suas pretensões com o cumprimento de suas prestações. Já no caso da extinção de forma anormal o contrato não deve ou não pode ser cumprido, seja por fatores anteriores, concomitantes ou supervenientes a sua formação. Quando ocorrer a extinção anormal por fatos supervenientes poderá ocorrer a resolução, a resilição ou a rescisão.
“A resolução trata-se de modalidade de extinção dos contratos por causa superveniente a sua formação, baseada na inexecução, por um dos contratantes, das obrigações ali geradas.
Designa-se resilição ao modo de extinção dos contratos por vontade de um ou dos dois contratantes.
O termo rescisão é, em nosso meio, utilizado ora no sentido de resilição, ora de resolução e, até mesmo, como forma genérica de dissolução dos contratos. Todavia, em termos contratuais, rescisão consiste na ruptura de um contrato em que houve lesão.”
A imprevisão possui alguns pressupostos, dentre os quais, objetivos, tem-se que “à imprevisão tem cunho negativo, consistindo em se afastar as causas de extinção anormal do contrato: rescisão, resilição ou anulação, resolução por inexecução voluntária ou resolução por inexecução involuntária.” Caso ocorra a onerosidade excessiva deve-se, portanto, afastar a resolução por inexecução voluntária e involuntária “o legitimado ativo, que poderá ser o credor ou o devedor, deverá apresentar a condição de não moroso, pois perderá o direito de invocar a imprevisão e ingressará na ortodoxa categoria de inadimplente, ajustando-se aos padrões da resolução por inexecução voluntária: ‘O pedido terá em mira as obrigações ainda não cumpridas. Aquelas cumpridas já estão extintas. A cessão do pagamento, porém, somente pode ocorrer com o ajuizamento da ação e a autorização judicial’”
“A lei contempla, ainda, a hipótese de no contrato caberem as obrigações apenas a uma das partes, como, por exemplo, no caso de a outra já haver cumprido a prestação a ela incumbente. A solução é a mesma: se aquela obrigação devida se tiver tornado excessivamente onerosa, pode o devedor pleitear que seja ela reduzida, ou alterado o modo de executá-la”
Outras ordenações jurídicas também apresentam a onerosidade excessiva nos contratos.
No Direito Italiano a onerosidade excessiva está prevista no artigo 1.467 do Código Civil de 1942 e assim disciplina:
“Os contratos de execução continuada, periódica ou de execução futura, se a prestação de uma das partes torna-se excessivamente onerosa em conseqüência de acontecimentos extraordinários e imprevisíveis, a parte que deve tal prestação pode demandar a resolução do contrato, com os efeitos estabelecidos no art. 1.458”.
Nas ordenações de Portugal, esse instituto também aparece:
“Art. 432, 1. Se as circunstâncias em que as partes fundaram a decisão de contratar tiverem sofrido um alteração anormal, tem a parte lesada direito à resolução do contrato, ou à modificação dele segundo juízos de eqüidade, desde que a exigência das obrigações por ela assumidas afecte gravemente os princípios da boa fé e não coberta pelos riscos próprios do contrato.”
Outra codificação que traz a idéia de onerosidade excessiva é o Código Civil Argentino, em seu art. 1.198, § 2º. Os efeitos da excessiva onerosidade no direito argentino corresponde à resolução do contrato, a pedido da parte prejudicada.
“O Código Civil de 2002 introduz, além dos arts. 478-480, outras indicções que cuidam da alteração das circunstâncias de fato, ao estilo dos arts. 620 (“Se ocorrer diminuição no preço do material ou da mão-de-obra superior a um décimo do preço global convencionado, poderá este ser revisto, a pedido do dono da obra, para que se lhe assegure a diferença apurada”) e 625 (“Poderá o empreiteiro suspender a obra: (...) II- quando, no decorrer dos serviços, se manifestaram dificuldades imprevisíveis de execução, resultantes de causas geológicas ou hídricas, ou outras semelhantes, de modo que torne a empreitada excessivamente onerosa, e o dono da obra se opuser ao reajuste do preço inerente ao projeto por ele elaborado, observados os preços”).
E o art. 317, que em se valendo do conceito de imprevisão, na verdade estabelece uma autêntica cláusula tácita de correção do valor de prestações contratuais ou de escala móvel, na hipótese do silêncio do contrato a esse respeito: “Quando, por motivos imprevisíveis, sobrevier desproporção manifesta entre o valor da prestação devida e o do momento de sua execução, poderá o juiz corrigi-lo, a pedido da parte, de modo que assegure, quanto possível, o valor real da prestação.”
No ano de 1990, através da Lei n. 8.078 foi instituído o Código de Defesa do Consumidor. Este Diploma disciplina em seu artigo 6º, V:
“Art. 6º - São direitos básicos do consumidor:
V- a modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas;”
O Código de Defesa do Consumidor foi instituído principalmente para manter a proteção a parte mais fraca da relação de consumo, para que tenha o equilíbrio dentro do mercado consumidor. “A sociedade de consumo, ao contrário do que se imagina, não trouxe apenas benefícios para os seus atores. Muito ao revés, em certos casos, a posição do consumidor, dentro desse modelo, piorou em vez de melhorar. Se antes fornecedor e consumidor encontravam-se em uma situação de relativo equilíbrio de poder de barganha (até porque se conheciam), agora é o fornecedor (fabricante, produtor, construtor, importador ou comerciante), que, inegavelmente, assume a posição de força na relação de consumo e que, por isso mesmo, ‘dita as regras’... Toda e qualquer legislação de proteção ao consumidor tem, portanto, a mesma ratio, vale dizer, reequilibrar a relação de consumo, seja reforçando, quando possível, a posição do consumidor, seja proibindo ou limitando certas práticas de mercado.”
O artigo 6º do CDC expressa os direitos do consumidor. “A Organização das Nações Unidas, a seu turno, promulgou a Resolução n. 39/248, isto em 10.04.1985, resolução essa que também se refere àqueles direitos fundamentais dos consumidores, direitos esse universais e indisponíveis, fazendo eco, aliás, com a própria doutrina dos direitos humanos.
É no item 3 que se encontra a síntese das normas de proteção, a saber:
a) proteger o consumidor quanto a prejuízos à saúde e segurança;
b) fomentar e proteger os interesses econômicos dos consumidores;
c) fornecer aos consumidores informações adequadas para capacitá-los a fazer escolhas acertadas de acordo com as necessidades e desejos individuais;
d) educar o consumidor;
e) criar possibilidade de real ressarcimento ao consumidor;
f) garantir a liberdade para formar grupos de consumidores e outros grupos ou organizações de relevância e oportunidades para que estas organizações possam apresentar seus enfoques nos processos decisórios a ela referentes.”
Essa Resolução da ONU de n. 39/248 foi, indubitavelmente, uma das fontes inspiradoras do CDC, assim como o Projet de Code de la Consommation, redigido sob a presidência do professor Jean Calais-Auloy, as leis gerais da Espanha, de Portugal, do México e de Quebec.
“Cláudia Lima Marques (2000:13-58) propõe que o tratamento das cláusulas abusivas no Código de Defesa do Consumidor está diretamente afetado por três primados fundamentais: princípio da vulnerabilidade; princípio da boa-fé objetiva; e o princípio do equilíbrio ou da eqüidade contratual.
O princípio da vulnerabilidade (art. 4º, I, CDC) considera o consumidor digno de uma tutela diferenciada, que lhe confira proteção como parte mais fraca nos vínculos de consumo, por conseqüência de sua posição de fragilidade econômica, jurídica, psíquica e física em relação ao sujeito preeminente no vínculo de consumo. Em se aplicando o princípio da vulnerabilidade, está-se dando eficácia ao primado constitucional da isonomia, tratando-se desigualmente os desiguais na medida de suas desigualdades.
O princípio da boa-fé objetiva revela-se como um standard e um padrão hermenêutico a guiar o sistema de consumo sob a égide da lealdade e da cooperação.
O primado do equilíbrio ou eqüidade contratual é o terceiro princípio, encontrando seu suporte normativo nos arts. 4º, III, e 6º, V, do Código de Defesa do Consumidor, que se revelaria na manutenção do sinalagma inerente aos contratos a ele submetidos.”
A legitimidade ativa para pleitear a revisão contratual, baseando-se no artigo 6º, V, é somente do consumidor. Não tem o direito, nesse caso, o fornecedor de entrar em juízo requisitando a revisão contratual alegando onerosidade excessiva do contrato celebrado, devido a circunstâncias supervenientes. Disciplina com clareza o CDC que essa proteção é exclusiva do consumidor, por estar esse em desigualdade com o fornecedor, tonando-se parte hipossuficiente na relação de consumo.
Para que ocorra a revisão, as prestações devem ser duradouras ou periódicas. “As prestações duradouras classificam-se em divididas, fracionadas ou repartidas, se seu cumprimento se efetua em parte, em momentos temporais distintos, com seu preço pago em parcelas. As duradouras podem ser também continuativas, contínuas ou de execução continuada, quando a prestação consiste numa ação ou numa abstenção que se prolonga ininterruptamente, como ocorre na obrigação do locador de assegurar ao locatário o uso e gozo do bem locado.”
Entende Fabiana Rodrigues Barletta que “outro requisito necessário à revisão será a bilateralidade dos contratos ajustados, ou seja, a bilateralidade no sentido da reciprocidade entre as prestações das partes contratantes. ‘São contratos sinalagmáticos, bilaterais, ou com prestações recíprocas, aqueles que fluem, ao mesmo tempo e para cada uma das partes, obrigações e direitos a prestações recíprocas, ligadas entre si por uma relação de interdependência’”.
Em sentido diverso, Otavio Luiz Rodrigues Júnior defende que “aqui, com maior razão, qualquer contrato de consumo (unilateral ou bilateral, comutativo e oneroso) pode sofrer os efeitos da teoria da imprevisão, o que se dá por influência do princípio da interpretação mais favorável ao consumidor.”
“Apresenta-se polêmica a discussão em torno de a resolução de contratos por excessiva onerosidade atingir somente os contratos oneroso, ou de se estender aos gratuitos... Tradicionalmente, a doutrina entendeu também que somente aos comutativos seria aplicada a teoria da imprevisão com o propósito de resolver o contrato que sofresse ônus de grande monta e que essa possibilidade não afetaria os contratos aleatórios. Porém, mesmo contratos aleatórios, se provenientes de uma relação de consumo, poderão ser revisados na forma prevista pelo artigo 6º, V, 2ª parte, do CDC, se as prestações pagas pelo consumidor forem excessivamente oneradas por motivos posteriores à contratação, gerando profundo e injustificável deseqüilíbrio contratual para o consumidor. Isso pode ocorrer, por exemplo, no contrato de seguro.”
Assim como no Código Civil, no CDC o consumidor não poderá estar em mora, mas nesse caso poderão ocorrer exceções. ”Em princípio, também se nega ao consumidor que esteja em mora a revisão contratual por excessiva onerosidade superveniente à contratação. Observe-se que dele também se exige diligência no cumprimento de suas obrigações, e tal exigência implica atitudes precavidas, como o pedido judicial de revisão contratual antes de se constituir em mora, ou mesmo o depósito judicial do valor da prestação para afastar a mora. Contudo, há que observar se o atraso no pagamento das prestações foi justificado. Justifica-se o estado de mora, por exemplo, no caso d a excessiva onerosidade ocorrer tão subitamente de forma a inviabilizar para o consumidor a proposição, em tempo hábil, da ação de revisão contratual, ou ainda no caso de a onerosidade ser de tal monta que o consumidor não tem condições de depositar a quantia a ser discutida posteriormente, por meio do pedido de revisão contratual em juízo. Nessas hipóteses, e em outras assemelhadas, que o juiz examinará caso a caso, ainda poderá ser concedida ao consumidor a revisão contratual pleiteada, apesar de seu estado de mora.”
“Frise- se que a onerosidade excessiva não precisa acarretar para o devedor a impossibilidade de cumprimento da obrigação. Portanto, se o adimplemento da obrigação ocasionar sacrifícios tão grandes para o consumidor a ponto de ferir sua dignidade, se os obstáculos a serem superados puderem levá-lo à pobreza, evidentemente tal consumidor encontra-se em situação de excessiva onerosidade... Não se exige também que a excessiva onerosidade superveniente para o consumidor importe em extrema vantagem para o fornecedor.“
Não é necessário, para o CDC, que o fato superveniente seja anormal, extraordinário, imprevisto e imprevisível. Para configurar a onerosidade excessiva é indispensável apenas a superveniência para ocorrer a revisão.
A sentença que conceder a revisão ou a resolução do contrato terá efeito retroativo a data do fato gerador da onerosidade excessiva, divergindo assim do Código Civil que disciplina ser retroativa a sentença até a data da citação.
O artigo 51 do CDC traz em seu bojo o fato do consumidor estar em desvantagem com relação ao fornecedor, em uma eventual relação contratual, devendo assim ser protegido pelo Estado.
“Art. 51 – São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que:
IV – estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a eqüidade;
§ 1º - Presume-se exagerada, entre outros casos, a vantagem que:
III – se mostra excessivamente onerosa para o consumidor, considerando-se a natureza e conteúdo do contrato, o interesse das partes e outras circunstâncias peculiares ao caso.”
Portanto “a onerosidade excessiva pode ensejar: a) o direito do consumidor à modificação da cláusula contratual, a fim de que se preserve o equilíbrio do contrato (art. 6º, V, CDC); b) a revisão do contrato em virtude de fatos supervenientes não previstos pelas partes quando da conclusão do negócio (art. 6º, V, Segunda parte, CDC); c) a nulidade da cláusula por trazer desvantagem exagerada ao consumidor (art. 51, IV, e § 1º, III, CDC).”
“A teoria da imprevisão serve de mecanismo de efetivo reequilíbrio contratual, quer recompondo o status quo ante que animou o contrato ao tempo de sua formação (efeito da teoria da condição implícita, a implied condition do direito inglês), quer o ajustando à realidade superveniente por modificações eqüitativas, e, como tal, deve representar, em princípio, pressuposto necessário da revisão contratual e não de resolução do contrato, ficando esta última como exceção. Assim é que a Lei inquilinária n. 8.245/91 dispõe sobre a revisão judicial do aluguel a fim de ajustá-lo ao preço de mercado (art. 19) e o Código de Defesa do Consumidor prevê, expressamente, a revisão das cláusulas contratuais (e não a resolução do contrato) ‘em razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas’ (Lei n. 8.078/90, art. 6º, V), ou a nulidade delas (art. 51, IV, e § 1º, III). O NCC, ao eleger a cláusula, inverte, todavia, a equação, utilizando a teoria para pedido resolutivo como regra.”
Baseado nos princípios constitucionais da solidariedade social e da igualdade substancial, o Código de Defesa do Consumidor surge como o grande divisor de águas no panorama do direito brasileiro, criando novas bases teóricas para a revisão contratual. “Entre os valores constitucionais e os princípios introduzidos pelo Código de Defesa do Consumidor sugere a aplicação da teoria revisionista nas diversas hipóteses em que se manifeste a vulnerabilidade contratual. Explora, neste percurso... a potencialidade dos princípios da vulnerabilidade, da boa fé objetiva e do equilíbrio das prestações. Como conseqüência, compreende-se como a proteção do contratante em posição de inferioridade.”
Já no Novo Código Civil, alguns dos doutrinadores acreditam que deva ser cautelosa a intervenção judicial na revisão dos pactos e cláusulas contratuais, onde o contratante devedor, fragilizado e com a vontade viciada pelo desespero da crise que se encontre, pode enxergar no socorro judicial sua única esperança. “O que conta, na hora de pagar, é a onerosidade excessiva; acumulação de juros vedado em lei; a variação ilícita de taxas oficiais, que não poderão, jamais, alterar os efeitos econômicos do contrato de trato sucessivo. Parece-nos que, a luz dos princípios do direito adquirido, da equivalência das prestações, dos pacta sunt servanda e do abuso de direito (crime contra a economia popular), o direito assegura a imutabilidade dos contratos, nos termos da lei e taxas judiciais da data de sua celebração (tempus regit actum).”
Neste caso, percebemos a clara distinção entre os dois Códigos, uma vez que o Novo Código Civil e seus doutrinadores enxergam que os contratantes estão em grau de igualdade no momento da celebração do contrato, tendo o Direito dever de evitar o enriquecimento ilícito através da teoria da imprevisão, cláusula rebus sic stantibus e outros remédios dentro de nosso ordenamento, mas, mantendo sempre o princípio da pacta sunt servanda. Enquanto que o Código de Defesa do Consumidor, entende que o consumidor está sempre em grau de inferioridade para com seu contratante, sendo este, por falta de experiência, malícia, conhecimento técnico etc., passível de erro que torne excessivamente oneroso seu contrato.
No novo ordemento civil, para que se possa pensar em alteração contratual sob o manto da onerosidade excessiva, deve ocorrer acontecimentos extraordinários e imprevisíveis. Não podem ser exclusivamente subjetivos, devem atingir uma camada mais ou menos significativa da sociedade.
Um fato será extraordinário e anormal para o contrato quando se afastar do curso ordinário das coisas. Será previsível quando as partes não possuírem condições de prever, por maior diligência que tiverem. Não podemos atribuir a qualidade de extraordinário ao risco assumido no contrato em que estavam cientes as partes da possibilidade de sua ocorrência.
Esses acontecimentos devem refletir-se diretamente sobre a prestação do devedor. O instituto caracteriza-se pela incidência sobre a prestação devida, tornando-a excessivamente onerosa para o devedor. Isto é o que distingue a imprevisão do caso fortuito ou da força maior. É questão de fato a ser apreciada no caso concreto.
Os contratos devem ser de prazo ou de duração. Os de cumprimento imediato não comportam a revisão pela onerosidade excessiva porque esta surge com o passar do tempo, ainda que muito próxima à feitura do contrato. O fato deve ser imprevisto e imprevisível aos contratantes. Se algum deles já sabia de sua existência ou de sua ocorrência, o enfoque desloca-se para os vícios de vontade. O campo de atuação é nos contratos bilateriais comutativos ou unilaterais onerososo.
Os fatos que causem a onerosidade devem estar desvinculados de uma atividade, positiva ou negativa, do devedor. Ausência de culpa.
A doutrina e a jurisprudência aludem, ainda, que para a utilização do instituto para a revisão contratual, não pode estar configurada a mora do devedor a qual, sem dúvida, pode verificar-se inclusive em face do fato imprevisto o que retira do devedor o status de mora.
A revisão contratual sempre opera-se mediante tutela jurisdicional e o pedido poderá conter objeto de liberação do devedor da obrigação ou redução do montante da prestação. O pedido objetivará sempre as prestações ainda não cumpridas, pois as já cumpridas tornaram-se ato jurídico perfeito e, por isso, imutáveis.
A revisão é matéria de caráter excepcional na teoria contratual.
É essencial neste instituto é a posição periclitante em que se projeta uma das partes no negócio, sendo irrelevante que haja benefício para a outra.
Nula é a cláusula contratual que pretenda retirar do contrato a sua possibilidade de revisão em face de verificação de fato superveniente imprevisto e imprevisível, porque inclusive cercearia o direito de ação.

segunda-feira, 1 de agosto de 2011

Adimplemento Substancial

in http://jus.uol.com.br/revista/texto/11703/adimplemento-substancial

 
Adimplemento, em sentido estrito, indica cumprimento da obrigação. Por vezes também é chamado de pagamento, implemento, solução, satisfação, quitação. A par disso, atualmente, emerge na doutrina e na jurisprudência a "Teoria do Adimplemento Substancial", derivada do Direito Inglês [01], onde é conhecida como substancial performance [02].
O Código Civil de 2002 não previu, formalmente, o adimplemento substancial. Sua aplicação vem se realizando com base nos princípios da boa-fé objetiva (CC/02, art. 422), da função social dos contratos (CC/02, art. 421), da vedação ao abuso de direito (CC/02, art. 187) e ao enriquecimento sem causa (CC/02, art. 884) [03].
O adimplemento substancial analisa a obrigação em seu aspecto essencial, e não secundário. Examina se, no caso concreto, a obrigação foi cumprida em seus pontos relevantes, importantes, essenciais [04]. Não supervaloriza elementos de somenos importância.
O adimplemento substancial não permite, por exemplo, a resolução do vínculo contratual se houver cumprimento significativo, expressivo das obrigações assumidas.
Nas palavras de Clóvis do COUTO E SILVA é "um adimplemento tão próximo do resultado final, que, tendo-se em vista a conduta das partes, exclui-se o direito de resolução, permitindo tão somente o pedido de indenização." [05]
Avalia, portanto, o grau de "descumprimento" da obrigação em toda sua extensão, e não de maneira isolada ou com base na literalidade de certas cláusulas contratuais ou disposições legais que, num juízo apressado, poderiam autorizar a resolução do contrato.
Nesse contexto, se ínfimo, insignificante ou irrisório o "descumprimento" diante do todo obrigacional não há de se decretar a resolução do contrato, de maneira mecânica e autômata, sobretudo se isso conduzir à iniqüidade ou contrariar os ideais de Justiça.
O adimplemento substancial atua, portanto, como instrumento de eqüidade diante da situação fático-jurídica subjacente, permitindo soluções razoáveis e sensatas, conforme as peculiaridades do caso.
A "Teoria do Adimplemento Substancial" tem sido aplicada, com freqüência, em contratos de seguro. Suponha-se um contrato desta natureza, firmado pelo prazo de um ano, em que se convencionou o pagamento do prêmio em 12 (doze) parcelas mensais. Assim, se o sinistro ocorreu no 11º mês, ocasião em que o segurado se encontrava em atraso quanto à prestação correspondente, não é razoável a negativa da indenização pela seguradora, mesmo que se invoque o art. 763, do CC/02, que contém a seguinte redação: "Não terá direito a indenização o segurado que estiver em mora no pagamento do prêmio, se ocorrer o sinistro antes de sua purgação."
Em casos tais, antes de se recorrer à interpretação literal de dispositivos legais ou contratuais, é preciso aquilatar o contrato em toda sua extensão; o comportamento das partes no decurso do vínculo; os efetivos e reais prejuízos, de parte a parte; a natureza e a finalidade do negócio; o número das prestações pagas etc. Somente desta forma, poder-se-á avaliar se, de fato, houve descumprimento real, e não meramente formal, do contrato. A não ser assim, corre-se o risco de se chancelar, por via oblíqua, interpretações que ofendam ao bom senso e conduzam ao absurdo, o que colide com preceitos de hermenêutica.
Atenta a isso, a jurisprudência, sensível à temática, e não se deixando seduzir por regras que possam conduzir à iniqüidade, tem adotado uma postura mais flexível. Observe-se:
Alienação Fiduciária. Busca e apreensão. Falta da última prestação. Adimplemento substancial. O cumprimento do contrato de financiamento, com a falta apenas da última prestação, não autoriza o credor a lançar mão da ação de busca e apreensão, em lugar da cobrança da parcela faltante. O adimplemento substancial do contrato pelo devedor não autoriza ao credor a propositura de ação para a extinção do contrato, salvo se demonstrada a perda do interesse na continuidade da execução, que não é o caso. Na espécie, ainda houve a consignação judicial do valor da última parcela. Não atende à exigência da boa-fé objetiva a atitude do credor que desconhece esses fatos e promove a busca e apreensão, com pedido liminar de reintegração de posse. Recurso não conhecido. (STJ – REsp 272739 / MG – Min. Ruy Rosado de Aguiar – 4ª Turma – DJ 02.04.2001 p. 299).
Vê-se, portanto, que o "adimplemento substancial" se contrapõe ao "inadimplemento fundamental" [06]. Neste último, a resolução é de rigor, porquanto, efetivamente, há descumprimento da obrigação em seus elementos primordiais, inclusive com a frustração das legítimas expectativas das partes depositadas no vínculo, muitas vezes acompanhadas de danos à parte inocente.
Com base nestas premissas, pode-se dizer que, para a configuração do adimplemento substancial, são necessários os seguintes pressupostos: a)- cumprimento expressivo do contrato; b)- prestação realizada que atenda à finalidade do negócio jurídico; c)- boa-fé objetiva na execução do contrato; d)- preservação do equilíbrio contratual; e)- ausência de enriquecimento sem causa e de abuso de direito, de parte a parte.
Com efeito, avaliar se suposta circunstância fática importa em descumprimento de contrato sob a perspectiva do adimplemento substancial impõe examiná-lo sob as lentes da realidade concreta vivenciada pelas partes, e não sob uma perspectiva formal-obscurantista, apegada a peias legais que somente contribui para o distanciamento entre o Direito e a Justiça.
Em suma, a recepção em nosso sistema jurídico da "Teoria do Adimplemento Substancial", além de estar em perfeita sintonia com os princípios e valores que norteiam o Direito Civil contemporâneo, atuando como fator de correção e adaptação de disposições legais e contratuais à realidade, é medida que se impõe como mecanismo de materialização da justiça contratual.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BECKER, Anelise. A doutrina do adimplemento substancial no direito brasileiro e em perspectiva comparativista. Revista da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Porto Alegre: Livraria dos Advogados, n. 1, v. 9, nov. 1993, p.62.
BIERWAGEN, Mônica Yoshizato. Princípios e Regras de Interpretação dos Contratos no Novo Código Civil, 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 2003.
BUSSATA, Eduardo Luiz. Resolução dos Contratos e Teoria do Adimplemento Substancial. São Paulo: Saraiva, 2007.
DA SILVA, Vivien Lys Porto Ferreira. Adimplemento substancial. 2006. Dissertação (Mestrado na área de direito das relações sociais, sub-área Direito Civil). Faculdade de Direito, Pontifícia Universidade de São Paulo.
MOURA, Carolina Maria Melo. Teoria do Adimplemento Substancial do Contrato de Seguro (Monografia no Curso da Escola da Magistratura do Paraná – Núcleo Londrina – inédito – texto gentilmente cedido pela autora), 2007.
OMAIRI, Elissane Leila. A doutrina do Adimplemento Substancial e sua Recepção pelo Direito Brasileiro. www.direitonet.com.br. Acesso em 09/09/2008.

NOTAS

  1. 1 Um dos primeiros casos sobre o tema foi Cutter versus Powell, de 1795. Na ocasião, Powell contratou Cutter como imediato do navio em viagem que se iniciou em 02/08/1793, saindo de Kingston-Jamaica com chegada em 09/10/1794 em Liverpool. Contudo, Cutter faleceu em 20/09/1794, não "concluindo" o contrato, no entendimento de Powell. Todavia, a viúva de Cutter ingressou em juízo e obteve êxito na demanda junto às Cortes da Equity. (BECKER, Anelise. A doutrina do adimplemento substancial no direito brasileiro e em perspectiva comparativista. Revista da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Porto Alegre: Livraria dos Advogados, n. 1, v. 9, nov. 1993, p.62.).
  2. Na Itália é conhecido como "inadempimento de scarsa importanza".
  3. MOURA, Carolina Maria Melo. Teoria do Adimplemento Substancial do Contrato de Seguro (Monografia no Curso da Escola da Magistratura do Paraná – Núcleo Londrina – inédito), 2007.
  4. BUSSATA, Eduardo Luiz. Resolução dos Contratos e Teoria do Adimplemento Substancial. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 37.
  5. Apud BECKER, Anelise. Op. cit., p.62.
  6. OMAIRI, Elissane Leila. A Doutrina do Adimplemento Substancial e sua Recepção pelo Direito Brasileiro. www.direitonet.com.br. Acesso em 09/09/2008.

sexta-feira, 8 de abril de 2011

Autonomia da Vontade na Formação do Negócio Jurídico - Uma Visão Crítica (Leitura para Civil II - FURG)

Por Enio Duarte Fernandez Jr.

Remonta, ainda, a própria idéia da obrigação a Roma antiga, à idade da pedra, à primeira co-habitação de dois homens no mesmo espaço e tempo.
Com a vivência tribal, os homens pré-históricos subdividiam-se em suas tarefas, primeiramente quanto à caça, agricultura, segurança da tribo, procriação e manutenção da raça.
Porém, como as relações humanas foram se aprimorando e se agigantando, como o passar dos tempos, o direito buscou tutelá-las, como não poderia deixar de ser, e acompanhou tal evolução, até chegarmos aos dias atuais, com os dispositivos legais hodiernamente existentes, que regulam tais relações, sejam de mercancia, de co-habitação, de subsistência coletiva, enfim.
Deixou-se de lado o constrangimento pessoal do devedor inadimplente, com a disposição de seu próprio corpo, aplicando-se, ainda, de forma excepcionalíssima a prisão civil pelo inadimplemento alimentar e do depositário infiel, nos termos da Carta Política hoje vigente.
Leciona Sílvio Venosa que “no tocante à execução das obrigações, como o vínculo incidia sobre a pessoa do devedor, a substituição para fazer recair a execução sobre os bens parece ter sido lenta e ditada pelas necessidades da evolução da própria sociedade romana. A princípio, a sanção do nexum, velho contrato do direito quiritário, era a manus iniectio, que, pela falta de adimplemento, outorgava ao tradens o direito de lançar mão do devedor. A lei Papiria Poetelia do século IV a.C. suprimiu esta forma de execução, a qual, tudo indica, já estava em desuso na época.”
Na idade média a teoria obrigacional estava vinculada aos princípios do BGB (código civil alemão) que, por sua vez, estavam calcados no direito germânico onde a autonomia da vontade era reduzida e a formalização dos contratos era presente e forte. Cita Venosa que a responsabilidade pelo descumprimento estaria vinculada à possibilidade da vingança privada e a responsabilidade penal.
No renascimento francês, então, volta-se ao estudo romântico e a influência da igreja através dos princípios morais, onde a palavra passa a ter maior força nos contratos, dando início ao dogma da vontade – pacta sunt servanda – inserida pela codificação napoleônica que traz forte influência para o código civil brasileiro de 1916 que, em verdade, foi gestado no século XIX e concebido segundo os marcos conceituais daquela sociedade – liberalismo francês – o que hoje entra em choque com o constante intervencionismo do estado no direito privado.
É que com a Constituição de 1824, onde foram recepcionados os diplomas legais portugueses, através do art. 179, XVIII, estabelecia-se o início da estruturação de um código civil para o Brasil. Tal iniciativa, de fato, não se deu por livre expressão de vontade nacional. Foi, de fato, influência da cultura européia onde Thibaut, em 1814, já defendia a necessidade de um código civil para a Alemanha, tese que foi contraposta por Savigny em sua célebre obra “Sobre a vocação de nossa época para a jurisprudência e a legislação”. Todavia, forte, e por conseqüência vencedora, foi a corrente codificadora e, em 1896, é promulgado o Código Civil Alemão. Antes, porém, em 1804, Napoleão já agraciava o povo francês com o Code Civile ou Code Napoléon e em 1811 foi a vez da Áustria ganhar o seu diploma civil.
Justamente nesse panorama jurídico cultural – 1804 – 1896 – é que o civilismo brasileiro finca suas primeiras raízes e dá-se, em 1845, através de Carvalho Moreira (Barão de Penedo) a primeira estrutura de um código civil chamado Da revisão geral e codificação das leis civis e do processo no Brasil. A contar de então, inúmeros projetos e esboços foram efetuados e neles sempre contido o direito obrigacional até que, em 1941, foi apresentado perante o congresso nacional um anteprojeto de código civil das obrigações o qual não teve maiores desenvolvimento e análise até 1963/1964, que fundiram os três anteprojetos anteriores em um só e que foi esquecido pelo projeto de 1975, atual Código Civil, que manteve o direito obrigacional em seu corpo.
Na antes mencionada evolução social que, paralelamente, o direito obrigacional vê-se atrelado pois, como muito bem ensina Sílvio Venosa “A importância das obrigações revela-se por ser projeção da autonomia privada no direito” pois “estão presentes desde a atividade mais simples até a atividade mais complexa da sociedade. O direito das obrigações dá o suporte econômico da sociedade, porque é por meio dele que circulam os bens e as riquezas e escoa-se a produção.” E contra tal posicionamento é impossível levantar-se objeções porque atende-se, assim, a uma necessidade imperiosa de dar maior segurança aos relacionamentos.
O aumento do consumo de bens duráveis, conseqüência inexorável do progresso industrial, e o crescimento do chamado mercado de capitais, notadamente com os efeitos do mercado global, foram fatores determinantes para que ao sistema normativo brasileiro fossem agregadas regras disciplinadoras de diversas questões.
É evidente que tais questões relativas ao crédito não são novas. Desde há muito está presente no âmbito do comércio de bens intensa preocupação em torno da necessidade de se criarem instrumentos jurídicos capazes de permitir a ampla circulação dos bens, acompanhados de mecanismos de proteção ao crédito, ao credor e ao devedor, enfim, ao exteriorizar do convívio social representado, no caso, pelo comércio.
De fato, há necessidade de garantias que permitam ao crédito como instrumento de realização de negócios, a necessária ‘credibilidade’ e, se possível como objeto final, a praticidade de seus mecanismos na garantia de resgate destes créditos.
O negócio jurídico há de ser tutelado como forma de manutenção da ordem social. Este é o escopo primeiro do direito obrigacional ao nosso ver, ou seja, efetivamente dar ao cidadão o que nominou Jorge Pinheiro Castelo, antes citado, de Segurança Juridica.
Nesse contexto, há que se pensar na integridade do sistema jurídico, que deve acolher novos instrumentos em harmonia com seus princípios e regras, de forma que o advento de novos mecanismos não cause fissuras na ordem constitucional ou provoque desarranjos no sistema normativo infraconstitucional.
Em benefício do credor, engendram-se garantias que permitam a ele o recebimento de seus haveres diante do devedor, de modo a que, mantido o seu capital, possa continuar exercendo suas atividades comerciais ou financeiras.
E, em favor do devedor, tem-se criado sistemas que permitam, a um só tempo, o acesso cada vez maior à fruição dos bens que se encontram no comércio e o mínimo possível de sacrifícios e constrangimentos diante das situações advindas da contratação (e principalmente do inadimplemento) do crédito. Cite-se, nesse caso específico, o micro sistema de direito obrigacional jurisdicizado pelo Código de Defesa do Consumidor.
Não é fácil a tarefa consistente em conciliar tantos interesses, principalmente diante do crescente desprestígio das garantias eminentemente pessoais, fruto da massificação do consumo e do alargamento do crédito.
O sistema, por razões notórias de evolução social, tem preferido estabelecer garantias que recaiam sobre os próprios bens, de modo a que estes possibilitem ao credor, na hipótese do inadimplemento, o imediato recebimento de seu crédito. A transmutação derivada da evolução social da responsabilização pessoal para patrimonial.
Se, por um lado, há o reclamo das classes empresariais, que pedem melhores regras de disciplina do tráfego comercial e financeiro, há, por outro lado, necessidade de se preservarem direitos e garantias dos usuários do crédito.
Mas, não é só.
Para que se possa ter uma idéia aproximadamente correta do complexo mecanismo de funcionamento do sistema de crédito para financiamento do consumo, é preciso lembrar que os recursos destinados ao fornecimento de crédito ao consumidor são oriundos, fundamentalmente, da captação que a instituição financeira realiza perante terceiros, chamados investidores.
Trata-se de uma longa cadeia de interesses econômicos que, grosso modo, assim funciona: a instituição financeira capta recursos de investidores no mercado financeiro, contratando remuneração de acordo com critérios de mercado; esses recursos, captados no mercado, são aplicados em operações de crédito; o favorecido com o crédito adquire bens de consumo; com o ‘retorno’ desses recursos à instituição financeira, esta paga aos investidores.
Nesse exemplo, o inadimplemento das obrigações assumidas pelo devedor (que do crédito se serviu para a aquisição de bens) acarretará sem dúvida alguma na ruptura do sistema de captação de recursos, pois, se a instituição financeira não contar com recursos para honrar seus próprios compromissos diante dos investidores, dificilmente terá meios para fazê-lo e, nessa hipótese, de certo não conseguirá ampliar a captação.
A conseqüência direta da diminuição da captação de recursos será o encolhimento da oferta de crédito, com elevação nas taxas de juros e interesses o que oportunizará, por certo em evidente prejuízo para o consumidor dos bens de produção que necessite de crédito para adquiri-los e para tanto assumirá o encargo elevado representado pelos juros e taxas de interesses elevados pelo risco crescente da inadimplência.
Ora, se ao crescimento econômico impar se faz um sistema financeiro saudável, com taxas de juros compatíveis com o mercado, tais taxas de juros devem ser reduzidas para tanto e, para a redução das taxas de juros, impar se fazem instrumentos aptos e capazes de minimizar o risco do fornecedor do crédito.
Juros somente reduzem-se, em prol da sociedade como consumidora final do crédito, com um sistema econômico-financeiro-empresarial-jurídico de regras claras e sérias, além de eficazes, impondo-se ao Estado fazer viger tal sistema de pesos e contrapesos pois, como leciona Venosa ‘em todas estas atividades, da produção à distribuição de bens e serviços, imiscui-se o direito obrigacional’.
Linhas atrás falou-se no Pacta Sunt Servanda como princípio do direito obrigacional e que, forte nesse, parte da doutrina assenta a impossibilidade do intervencionismo estatal nos relacionamentos privados. Tal posição, aliás, encontra respaldo da jurisprudência.
Contudo, tem de ser visto com cautela tal posicionamento porque sua plena aceitação está limitada e dependente de duas condições fáticas de inafastável presença que são a compreensão do trato celebrado e também deve ter-se em conta a possibilidade de entendimento do alcance dos efeitos dos mesmos pelas partes tratantes. Enquanto isso não se verifica, não há o que se falar em dogma da vontade, traduzido no Pacta Sunt Servanda.
O negócio jurídico é conceituado de formas diversas por renomados doutrinadores, porém, todos conformes ao defini-lo, sinteticamente, como o ato ou atos pelo qual ou os quais o indivíduo regula, por si, seus interesses nas relações com os seus semelhantes. É o ato pelo qual o direito liga os efeitos mais conformes à função sócio-econômica que lhe caracteriza o tipo.
Orlando Gomes, por exemplo, o define como sendo o ato de autonomia privada, ou seja, a atividade humana simples ou complexa correspondente à essência da autodeterminação dos interesses particulares dirigida à esse fim.
Conforme sua natureza, o contrato, inspirado no dogma da vontade, passou a ser considerado lei entre as partes, no momento em que a autonomia individual passou a ser considerada, simplesmente, como a liberdade de querer algo. A vontade é somente a fonte, o pressuposto normal da autonomia em seu sentido mais amplo.
Respeitando a autonomia privada, o direito toma como objeto de suas previsões, os fatos em seu significado natural, que visa orientar a noção de negócio jurídico como fato natural ou social.
Ou seja, para esses atos de autoregulamentação de interesses privados, realizados nas condições permitidas, a lei os dota de eficácia jurídica.
Santoro-Passareli, citado por Raquel Schmiedel, em seu Livro Negócios Jurídicos - Nulidades e Medidas Sanatórias, 2a. Ed., São Paulo, Ed. Saraiva, 1985, traduz bem esse ponto, ao definir o negócio jurídico como ato de autonomia privada dirigida a um determinado fim que o ordenamento jurídico reputa merecedor de tutela.
A autonomia privada não consiste nem na liberdade de querer nem em poder criar normas jurídicas, mas sim em auto-regulamento de interesses particulares dos contraentes, posto que, nem todos os atos de autonomia privada apresentam relevância jurídica e, segundo a professora Raquel Schmiedel, ainda que possuam, poderão ser juridicizados não como atos de autonomia privada, mas como atos jurídicos stricto sensu, meros atos materiais, operacionais, na terminologia de Pontes de Miranda, Atos-Fatos Jurídicos.
A competência de criar normas jurídicas é de quem, investido legalmente, tem tal atribuição, o que não é, em momento algum, atribuído aos contraentes, segundo as normas legais vigentes.
A autonomia privada tem relevância jurídica enquanto é elemento fático de uma categoria jurídica, que irá fazer parte do mundo jurídico através da incidência de uma determinada regra jurídica - fenômeno da jurisdicização.
Essa autonomia privada, contudo, não é ilimitada, encontrando barreiras, seja na moral, bons costumes, no ideal do bem comum, submissão ao ordenamento jurídico, dentre outros, o que impedirá os contraentes de buscar obter, mediante o uso da autonomia privada, interesses particulares contrários aos ditames legais, reprovados pela moral e pelos bons costumes. Tais limites constituem, contudo, prova suficiente do reconhecimento da autonomia privada pelo ordenamento jurídico e é por tal reconhecimento que esta tem acesso ao mundo jurídico.
Logo, quanto ao aspecto de sua estrutura (como é) o Negócio Jurídico é um ato que consiste numa declaração ou em um simples comportamento. Tal ato deve ser reconhecido no ambiente social, por declarações, comportamentos, passando a ser um fato social, suscetível de interpretações e valorações por parte dos consorciados.
Quanto à sua essência, já que o negócio jurídico é um ato de vontade e esta é essencial àquele, é elemento que integra sua estrutura. Essa vontade é qualificada, tendo em vista que é determinada, ou seja, dirigida a um determinado fim, socialmente relevante.
A intenção negocial é o elemento nuclear do suporte fático, mas só há efeitos jurídicos se a regra jurídica os determina, atribuindo-os ao fato jurídico.
Para Pontes de Miranda, a vontade só produz efeitos se a regra jurídica o estabeleceu, se deixou no figurante branco para auto-regulamento.
Ou seja, a aptidão do negócio jurídico não decorre do ato, mas da norma legal que o faz penetrar no mundo jurídico, ou o recebe e juridiciza. Os efeitos se produzem para atender às finalidades pleiteadas pelos particulares contraentes, enquanto secundados pelo ordenamento jurídico.
Raquel Schmiedel assim sentencia que a vontade negocial só será operante no mundo jurídico enquanto manifesta. A chamada vontade interna ou real só excepcionalmente poderá ser avocada quando indispensável à compreensão do verdadeiro escopo perseguido pelos declarantes, ou, como causa de invalidade, toda vez que se configurar um dos vícios de consentimento.
Negócio Jurídico é, portanto, um preceito de autonomia privada dirigido a interesses concretos, próprios de quem os estabelece. Tem caráter vinculativo. É a estatuição ordenadora de uma linha de conduta, por meio das quais o indivíduo regula as suas relações com os demais pares e possui eficácia se manifesta no plano social e depois se destina a produzir também no plano jurídico.
Por fim, cabe estudar a conceituação segundo sua função (porquê).
Inegável que a autonomia privada tem cunho social e seu reconhecimento pelo mundo jurídico se faz impar para regular e tutelar certas situações que o ordenamento jurídico assim o determinar, como garantia de equilíbrio e coesão sociais.
É o negócio jurídico o principal instrumento, colocado à disposição pelo ordenamento aos contraentes, para que regulem seus interesses, restando como a principal categoria do direito privado e, por seu intermédio, a ordem jurídica instaura sua função dinâmica, regulando a distribuição de bens e serviços, indispensáveis à coletividade.
Não há, pois, como negar-se a conceituação de negócio jurídico, sob o ponto de vista de sua função, como sendo o ato em que as partes regulam seus interesses, tutelados pelo ordenamento jurídico, para manter a estrutura social indispensável à sociedade, de interesse da comunidade.
Conclui-se, portanto, que o negócio jurídico, sob o ponto de vista funcional, é o ato pelo qual o indivíduo regula, por si, seus interesses nas relações com seus pares, ato de autonomia privada ao qual o direito liga os efeitos mais conformes à função sócio-econômica que caracteriza o tipo, visando resguardar o interesse social de distribuição de bens e serviços.
Com o passar dos tempos, o negócio jurídico passou a ser tratado como uma declaração de vontade em que o indivíduo, como já visto, regula suas atividades com os demais. Tal qualificação do negócio como declaração de vontade é o resultado de elaboração arbitrária segundo a tendência e no sentido daquele dogma.
Através da Crítica do Dogma da Vontade nega-se que a mesma se encontre em primeiro plano no negócio jurídico e que os efeitos jurídicos e a razão do mesmo deva ser querida, como se pretende quando postulado uma vontade individual orientada para os efeitos jurídicos.
A vontade pertence à formação (Gênese) do negócio jurídico, mas não ao conteúdo do ato de autonomia privada como fato social, posto que, contrariu sensu, exagera-se o contributo que a vontade dá à produção daquele efeito, fazendo descobrir ou procurar nela a sua razão exclusiva ou precípua.
A declaração de vontade significa a faculdade, ou atividade, do querer, como fato psíquico interno que, na sua realidade integral, é estranho ao negócio e não se torna socialmente reconhecível.
Crendo-se na onipotência da vontade individual, induz-se a desconhecer o múltiplos limites sociais e jurídicos da autonomia privada (moral, bons costumes, ordenamento jurídico, etc). Faz pensar que a essência do negócio jurídico consiste apenas na vontade e que, em referência a esta, a declaração só tem uma função puramente complementar ou instrumental, como meio de prova, revelação ou reconhecimento exigido apenas no interesse e para garantia da contraparte, mas não necessária.
Leva-nos a crer que, na interpretação do negócio, se deve investigar primeiro qual foi a vontade interna, ainda que mantida em segredo, oculta, ou nutrida apenas por uma das partes contraentes e, só depois, se deverá verificar se a declaração tornou-se manifesta, ou se ela está realizada no comportamento ou era compartilhada pela outra parte.
Mas, o preceito de autonomia privada aparece pela primeira vez, com a declaração e com o comportamento. É a partir desse momento que adquire vida como entidade duradoura, exterior e separada da pessoa de seu autor. Funciona para o futuro, vivendo vida própria, ou seja, independente da vontade que lhe deu o ser e até, por vezes, contrapondo-se à ela, ao passo que a vontade, como fato psíquico, é qualquer coisa que se confunde com a pessoa e não é aceitável se independente desta. O preceito do negócio é qualquer coisa separada da pessoa e pode contrapor-se-lhe.
O que gera o preceito contratual não é um encontro oculto, uma fusão dos quereres, mas a permuta das respectivas declarações e a sua consciente congruência, ou a intencional reciprocidade e congruência dos comportamentos.
Tal acordo de intenções somente possui valor jurídico na medida em que seja reciprocamente reconhecível, e, portanto, em função dessa troca ou reciprocidade e congruência.
Onde falta o acordo (consciência/congruente), falta a própria essência do contrato e é inútil procurar saber se terá havido, ou não, uma intenção comum, que seria irrelevante.
A crítica cinge-se em questão de que a essência normativa do negócio, escapa, completamente, à evanescente qualificação da vontade. O perigo da ambigüidade não está menos próximo sempre que a aposição qualificativa da vontade ou é inteiramente inútil ou imprópria e usurpa o lugar de uma referência à personalidade e à liberdade individual. Isto torna claro que a qualificação induz a estabelecer entre poder e vontade um vínculo, conexão esta que não existe. O poder (ou vínculo) somente existe conceitualmente, a referência pura e simples a um sujeito, ainda que incapaz de querer e, portanto, a palavra vontade limita-se a ocupar o lugar da idéia de pessoa.
Tal discussão surge no momento em que se atribui à declaração um valor puramente indiciário e complementar e, portanto, obriga a presumir como normal uma vontade, mesmo quando não há nenhuma, e a figurar como declarada uma vontade, quando não o foi. Tudo uma ficção.
O regulamento escolhido pelas partes deve corresponder à conveniência particular, sendo esta apenas índice à sua determinação causal, dirigida a um resultado prático, a sua intenção prática.
Porém, deve ter-se em conta que, como a vontade, não menos significativa é a norma, que ninguém põe em dúvida que a vontade constitui elemento normal do negócio jurídico e que ela deve atender-se ao apreciar um comportamento. Apenas, se pretende relevar que o elemento vontade, como fato psicológico do indivíduo, deve tornar-se exteriorizado e reconhecido no ambiente social para, só então, adquirir relevância em face dos consórcios e obter tutela pelo ordenamento jurídico.
Ao exteriorizar-se a vontade como fator psicológico interno dos contraentes, as normas jurídicas tem um valor sintomático, indicativo da orientação legal ao tratar da autonomia privada exteriorizada, na medida, como já alegado, em que mostram uma valoração.
Se a vontade, como fator psicológico interno, fosse o único fator decisivo, não haveria razão para manter de pé, ou só afastar mediante reação da parte interessada, negócios em que se mostra deficiente o elemento subjetivo, ou a própria capacidade de entender e querer. O erro, ainda que essencial, não justifica um ação de anulação, a não ser quando seja reconhecível pela outra parte, tendo em conta o conteúdo, as circunstâncias e as partes do contrato. Se o único fator decisivo fosse o interno, não haveria razão para, em caso de simulação por exemplo, estabelecer a inoponibilidade da relação interna aos adquirentes de boa-fé do simulado adquirente.
A boa-fé do contraente, ou dos terceiros, merece, pois, a tutela jurídica. Em todo direito positivo a disciplina da autonomia privada constitui um todo harmônico que tem em si uma coerência e um estilo próprios. Princípio este que se deduz da relevância jurídica atribuída à exigência de recognoscibilidade e, de um modo especial, ao valor social da aparência, no que se refere à relação qualificante do ato que justifica, por exemplo, a aquisição, unida à conseqüente necessidade de tutelar o adquirente, no caso, que tem razão para prestar fé a essa aparência. Verifica-se não só no caso de simulação, mas também em casos de alienação, de disposição, etc...
Para Mengoni, a credibilidade, e portanto a boa-fé da contraparte, é constituída pela aparência como fato social, pelo que deve ser tutelada pela ordem jurídica.
Inconteste, pois, que as valorações normativas da lei sejam inspiradas pela exigência social da recognoscibilidade e destinadas à tutela da correspondente confiança. Trata-se de declaração preceptiva que nela deveria estar realizada. Não se supera o inevitável dualismo entre a declaração e a atividade preceptiva que nela deveria estar realizada, mas, muda o ponto de vista a perspectiva da qual o dualismo deve ser olhado e valorado. A vontade, como já alegado, será sempre uma coisa interna, inseparável da pessoa, coisa incontrolável. O preceito é uma coisa estabelecida, exprimida externamente no ambiente social e verificável sem possibilidade de equívoco.
Por conclusão, se o negócio é um ato de autonomia privada, que têm relevância social em relação aos demais, resta evidenciado que não bastará saber se o autor o quer e tinha capacidade para realizá-lo, sobretudo, se podia dar-lhe vida, dentro de que limites e por quais caminhos.
O preceito do negócio jurídico não é só, e não tanto, o resultado normal de uma vontade, mas é, sobretudo, a manifestação de um poder, de autonomia privada que é, acima de tudo, uma realidade da vida social e encontra a sua legitimidade no reconhecimento jurídico.
E é justamente esse o papel que cumpre ao Estado, segundo os novéis ditames do CC/02, ou seja, de fiscalizador da jurisdicização do negócio juridico, ou seja, se existem agentes capazes, forma prescrita ou não defesa em lei e se o objeto é lícito. Preenchidos tais requisitos objetivos, e atendidos aqueles subjetivos antes mencionados, ai sim presente estará o dogma da vontade.
Como sentencia Venosa “Como é no Direito das Obrigações que reside o grande baluarte da autonomia da vontade, cabe aos julgadores não esquecer este aspecto, como razão da própria existência do direito privado. Temos de encontrar um meio-termo, o que procurou fazer o Projeto de 1975, que redundou no presente Codigo de 2002, entre o espírito liberal do Código, que dá confiança ao indivíduo e sua vontade, e a corrente social que, sob o manto da justiça social e das necessidades modernas de produção, procura inserir o individuo numa disciplina coletiva.”
Assim, a autonomia privada, ou da vontade, é o campo de atuação do particular sem infringir a lei, está limitada no novo diploma civil àquelas condicionante – trata-se da descentralização nomogenética, onde o ao estado cumpre o papel fiscalizador e ao privado a gênese legal de seus relacionamentos.

quarta-feira, 6 de outubro de 2010

Se um cachorro fosse professor, você aprenderia coisas assim:


Quando alguém que você ama chega em casa, corra ao seu encontro.
Nunca perca uma oportunidade de ir passear.
Permita-se experimentar o ar fresco do vento no seu rosto.
Mostre aos outros que estão invadindo o seu território.
Tire uma sonequinha no meio do dia e espreguice antes de levantar.
Corra, pule e brinque todos os dias.
Tente se dar bem com o próximo e deixe as pessoas te tocarem.
Não morda quando um simples rosnado resolve a situação.
Em dias quentes, pare e role na grama, beba bastante líquidos e deite debaixo da sombra de uma árvore.
Quando você estiver feliz, dance e balance todo o seu corpo.
Não importa quantas vezes o outro te magoa, não se sinta culpado...volte e faça as pazes novamente.
Aproveite o prazer de uma longa caminhada.
Se alimente com gosto e entusiasmo.
Coma só o suficiente.
Seja leal.
Nunca pretenda ser o que você não é.
E o MAIS importante de tudo....
Quando alguém estiver nervoso ou triste, fique em silêncio, fique por perto e mostre que você está ali para confortar.
A amizade verdadeira não aceita imitações !!!

segunda-feira, 30 de agosto de 2010

O nascimento das sardas......




Le decían “Pecas”.

Era un muchacho corriente, común. De pelo intensamente colorín, tez muy blanca, las infaltables pecas y caminaba como arrastrando su cuerpo bajo un gran peso. Su .mirada despierta, vivaz, ojos claros, desabridos, nariz ñata y casi respingada. El conjunto era un rostro sonriente y lleno de malicia, curiosidad y de natural inteligencia.

Sin llegar a ser agresivo, Tommy, que así se llamaba el niño, era sin embargo, muy poco paciente y frente al primer obstáculo con que se encontraba estallaba cual bomba casera y tenía una pataleta que más que rabieta, parecía una descontrolada marioneta funcionando por su cuenta, moviendo brazos y piernas y botando todo lo que se encontraba a su paso terminando en el suelo como si fuera un epiléptico de verdad.

Todo esto ocurría ante el asombro, que ya no era tal pues este show era repetitivo, de los juguetes y cosas que tenía en su cuarto. ¿Por qué le ocurría esto?.¿No se los había contado?-¿No?

Les decía que Tommy era o parecía inteligente. Uds. juzgarán. Estas rabietas las tenía muy en privado, en su recámara, donde él era rey y señor, o mejor donde él era esclavo de sus fracasos escolares y donde nadie vería su inédita cara.

Hay que entender que sólo tenía ocho años y patinaba sobre los nueve- En realidad alcanzar a los nueve le estaba costando más que una simple caminata.

Tenía cada problema que a él le parecía que su existencia era como caminar cuesta arriba siempre y con su mochila llena de problemas:
¿Problemas!¡Problemas!¡Problemas!-Eso decía cada tarde que llegaba a su querido cuarto, a su mundo encerrado entre cuatro muros pintados de colores violentos: media pared de un color y desde la diagonal hacia arriba de otro color y así las cuatro paredes.

Gozaba de su reino y sólo admitía en él a sus padres, previo a su real autorización. Ellos, sus padres, de moderna estructura social, eran profesionales y sólo veían a su retoño por la mañana, en el desayuno, en que todos estaban apurados y por la noche, en la cena, cuando todos estaban fatigados. El resto del día en el colegio de empingorotado nombre extranjero, al que amaba y odiaba a la vez.

También entraba a su cuarto, por necesidad de él, y por derecho adquirido por ella, la doméstica, como le decía él. Auxiliadora de niños mal criados- decía ella.

Era una mujer cincuentona, llena de paciencia y gordura, encargada de la casa y “ ordenadora”del reino de Tommy-que siempre parecía un campo de batalla con bomba atómica y todo. No era “un bello desorden”, como dijera el poeta. Sino un auténtico, prolifítico y enorme desorden, un mega desorden.

Cada vez que la fámula arreglaba el cuarto exclamaba:¡Con ésto me tengo ganado el cielo!¡Tengo la paciencia de Job y la comprensión de un santo!.-El niño no es culpable. Está tan solo . Es obediente a sus padres y no juega en la calle.-siempre decía lo mismo-y agregaba: Su cuarto es su reino. Su colegio, su vida. Y cuando sus padres se dan un tiempo-el día domingo-para Tommy es el Paraíso-por dos horas, tiempo que ellos consideran suficiente para que el niño recorra la ciudad en su compañía. Bueno, decía, la santa mujer:¡ Esto no es tan malo!.

Un día, Tommy, regresó a su casa muy malhumorado. Ya en su cuarto se sacó la mochila y la lanzó al aire cayendo sobre la cama, chocando contra la pared cercana y desparramando sus cuadernos, libros, lápices, restos de colación por doquier. Su mochila, mal cerrada había regurgitado su contenido en un vómito muy especial. También una hoja de dibujo salió disparada y después de un gracioso balanceo en el aire como pidiendo permiso para aterrizar y después de girar sobre sí misma , como avezada bailarina se deslizó, suavemente, sobre la mesa de centro de la habitación y que cumplía las funciones de escritorio y se detuvo.

¡Vaya!-dijo- Tommy-Sabes volar. Haré un avión de ti.

Su cansancio y rabia habían desaparecido. Cogió del suelo una tijera para recortar. Pero al observar mejor vió sobre la hoja unos trazos con lápiz grafito muy inseguros que pretendían dibujar el contorno de un muchacho mirando de frente.
¡
Qué tenemos aquí!-se dijo Tommy. Pero algo le distrajo. Un ruido, quizás. Se dirigió a la puerta que abrió. No viendo nada, la entornó nuevamente. Iba a ir a su escritorio, pero divisando su cama, dijo: Voy a recostarme un rato, me siento cansado. Se deslizó sobre la cama y se recostó. Un minuto después se levantó violentamente diciendo: ¡Oh.no!...Es el dibujo que estuvimos haciendo en clases y que debo llevar terminado para mañana: Es el huasito para el mes de la Patria.

Frente a este nuevo desafío, Tommy, empezaba a sentirse mal y nuevamente le viene su mal humor. Su cabeza le arde y duele. Siente bocanadas de calor quemando su cuerpo. A duras pena alcanza la silla y se sienta frente a la mesa.

El no era así, pero no pudo contener su soledad de tanto tiempo y rompió en llanto de niño desesperado y privado de consuelo y apoyo frente a sus “terribles “problemas escolares. Se sentía incapaz de todo; nunca hacía nada bien hecho y sólo sus profesores le ayudaban a solucionar sus apuros en que ellos mismos lo metían

Le explicaban, le estimulaban, pero él no siempre entendía bien y después…después..él tenía que arreglárselas solo.

Los profesores sabían de su familia y nada más podían hacer por él. Sólo aconsejarle que tratara de superarse y le recordaban que si él se esforzaba, pronto tendría resultados mejores. ¡Era una víctima más del modernismo mal entendido!

Pero Tommy, ese día, se sentía como en el límite de sus infantiles fuerzas y lloró. Lloró por su soledad de niño bien. Lloró por su carencia de amor, por su carencia de compañía, por falta de una persona confidente. Deseaba un regazo donde afirmarse.

¡Hey…Oye! Ya.. pues..Me estás mojando todo. No ves que estoy…Eh…Humm…¡Ay! Tu sabes….!¡Estoy pilucho!

Tommy alzó su cabeza y miró alrededor. Allí estaban sus juguetes: El general cojo, la danzarina de ojos azules, su cajita de música. También el tambor mayor, un gallardo soldado y un tony. Pero él no tenía ningún juguete con grabadora que emitiera voz.

¡Oye tú, pecoso!-Mira pa· bajo. Aquí, el “monito” que estabas dibujando-

Tommy vio o creyó ver entre sus nublados ojos llorosos a su dibujo que empezara en clases.

Sí-dijo el dibujo-Soy yo quien te habla. Hazme un favor. Estoy tiritando de frío .¿ Me podrías poner un pantalón, ropa, camisa?¡Me podrías vestir!
Claro-atinó a decir Tommy-sin salir de su asombro. Se levantó de la silla y fue a buscar unos trapos que había por ahí. Su pieza era un caleidoscopio de objetos. Tomó las tijeras y empezó a recortar una chaqueta. Le asaltó una duda y dirigiéndose al “mono”, le preguntó:¿Qué hago primero, el pantalón o la chaqueta.

¡No seas idiota!.-Oh.-Perdona. ¿No ves que soy un”mono”a medio hacer. Debes terminarme con tus lápices. No con trapos…Hay que ser coherente con lo que haces. Mansa palabrita que me mandé-dijo el “mono”-y agregó: Es que soy un mono “instruído.”

Ah!-dijo Tommy-muy preocupado.-Apartó algunos lápices y empezó la tarea.-Al cabo de un rato, tiempo en que el “mono” permaneció en silencio, se oyó decir al mono:¡ Apúrate te dicen! ¡aparte de sucio estoy pilucho!¡Bendito nacimiento!

Listo ..¡Ya!-dijo Tommy-El mono se miró. Abrió tamaña boca y gritó ¿ Qué has hecho de mí imbécil?. El “mono” sería instruí-do, como él decía-pero su lenguaje era propio de un “ mono”flayte.

¿Cómo me vestiste?-Parezco tony-Bórrame.

Bah!-y éste!¿ De dónde salió?-pensaba en su cajita el tony de Tommy.¡ Qué comparación más odiosa!.¡No nace y ya discrimina!

Está bien-dijo Tommy-Recobrándose de su anterior asombro. Iba a tomar la goma que todo lo borra cuando le asaltó una idea. Dirigiéndose al “mono” le preguntó:¿Cómo debo llamarte?

Tienes razón .dijo el “mono”- Tú te llamas Tommy y yo no tengo nombre.

Tommy, frunció el ceño- Ese”mono” sabía su nombre-

Y desde hace mucho tiempo-habló el “mono”- adivinando el pensamiento de Tommy.
Agregó el “mono”: De acuerdo con lo que se acostumbra por aquí, al hijo primero, le ponen el nombre del padre, por lo general.¡ Tú serás mi padre!.¡Eres mi Padre!.¡Tú me creaste! Por consiguiente me pondrás el nombre que elijas.-¡Soy un hijo obediente!-Claro que en lo del nombre ,no más. Pero seremos grandes amigos.

¿Te parece bien llamarte”monín”?-dijo Tommy

No me parece. Yo no soy ningún “monín”y cuando me vistas decentemente, ese nombre no resultará. Es demasiado primitivo, cavernícola. ¿Oíste?-¡Salta con otro!

Uf! Qué genio-pensó Tommy.-Sabes-dijo-dirigiéndose al “mono”.En la escuela mis compañeros me dicen “Pecas”´¿Tú ves por qué?.-Como tú eres mi creación, te llamaré “Pequitas”, que quiere decir:¡Hijo de “Pecas”.-¿Aceptas?

Ya, Bueno. Conforme. Pero...Cuando me cambie de vestido, no te olvides de pintarme pecas en mi cara, Quiero que mi pelo sea, también, más cobrizo que el tuyo y quisiera estar vestido muy “in. Soy moderno-

Oye-dijo Tommy, a medida que continuaba su obra-¿Pequitas?¿Quién eres?¿De dónde vienes?¿Por qué naciste?

“Pequitas”-muy ufano con su nueva vestimenta-dijo-:Mira. Padre. Preguntas mucho. Si quisiéramos saberlo todo,, perderíamos nuestro tiempo en ello. Hoy día hay que ser prácticos, pragmáticos. Hacer más y preguntar menos.

Tommy-dijo. Pero en el colegio me dicen lo contrario: Hay que estudiar, redescubrir la verdad para no equivocarnos y hacer mejor las cosas-

Bueno- dijo “ Pequitas” No empecemos peleando. Te voy a decir algo. Yo nací para ti y por ti. Tú me creaste con tu imaginación. Soy un personaje que vive en tu cerebro. Sólo tu me ves. Sólo tú me oyes. Yo soy muy instruído. Sé mucho. Soy lo que tú has olvidado. Soy lo que tú has puesto atención en clases. Soy tus experiencias que vas captando sin darte cuenta. Soy tu memoria. Tus sentimientos.-Yo soy parte de ti. Los dos hacemos un todo. Tú tenías necesidad de crearme. Te hacía falta. Yo sólo acompaño a los niños que, como tú, está frustrados, pero que no son torpes. Yo soy tu inteligencia. Soy un pequeño doblez de tu mente. Ya sabrás más de mi. Ahora, quiero salir del papel. Esto sólo ha sido mi cuna. Tenía que tener un lugar físico donde nacer para que tú te dieras cuenta de que existo. Luego buscaremos un lugar para mi.

Tommy, torpe como era y más aún con lo que estaba aprendiendo, sin darse cuenta, volcó sobre “Pequitas” un frasco con tinta .que estaba abierto y manchó la mayor parte del dibujo.

“Pequitas”.gritó-¡Quítame la tinta, me hace daño!. Aún no estoy firme en mi nacimiento y me puedo deshacer. Has algo pronto.

A Tommy no se le ocurrió otra cosa mejor que echar el papel en agua y bajó corriendo las escaleras, ya que vivía en los altos, en dirección a la cocina desde donde trajo agua caliente que echó en el agua para entibiarla y esto haría más rápida la desaparición de la tinta, pensaba.

Efectivamente, la tinta desapareció, pero desgraciadamente y para horror de Tommy, también desapareció “Pequitas”.-No había nada.
Desesperadamente se fue a tirar a su cama a meditar. Se quedó dormido.

Un golpe en la puerta lo despertó. Eran sus padres que habían regresado. Se levantó y bajó a cenar.

¿Creen Uds. que “Pequitas” se fue definitivamente- Se desnació como dijera. ¿Qué habrá que hacer para que vuelva?

Tú que me lees ¿Has perdido tu propio “Pequitas”?.-A lo mejor nunca lo has tenido.-